O REPLICADOR

Agosto 03 2011

Em primeiro lugar gostava de lamentar o pouco movimento que o Replicador experienciou nos últimos tempos. Adiante para o importante.


Pairam campanhas pelo ar para “dar sangue”. O slogan do regime mais habitual é, “dê sangue ou não haverá o suficiente para si quando precisar”. Os paladinos do mesmo regime chamam-lhe “uma prova de altruísmo, apenas superada pelos dadores de medula”, os cépticos dizem “tácticas de medo”. Aí os paladinos dizem que os meios justificam os fins. Os cépticos vão-se embora e a conversa acaba. Pretendo advogar a introdução do mercado no negócio do sangue.

 

O sangue é um bem escasso, simplificando, na sua forma utilizável (saquinhos habitualmente de 500 ml) não existe o suficiente para todas as pessoas disporem à vontade deste recurso. O que o sistema de saúde do regime fez foi aplicar regras em que só a partir de um certo nível de necessidade é que o utente do sistema nacional de doença tem direito a que lhe façam uma transfusão. Do lado da produção dos saquinhos, aposta-se na boa vontade das pessoas. Afinal de contas produzir sangue é muito fácil, basta comer e ser saudável, geralmente uma boa parte da população preenche estes pré-requisitos sem sequer trabalhar conscientemente para isso. Uns minutos no banco de sangue e já está, por vezes até oferecem bolos ou, como nos EUA, cerveja, como bonificação por ser bom samaritano.

 

E ficam todos de olhos arregalados quando não há gente suficiente a dar sangue. Que egoístas… é preciso ter vergonha!

 

Vamos fazer agora um exercício e pensar noutro bem escasso: batatas. As batatas são muito simples de produzir. Basta um terreno com um mínimo de manutenção e produzem-se batatas. Deixemos então os senhores do regime ir buscá-las às várias propriedades por Portugal para colmatar uma necessidade que é uma praga ainda maior que a do sangue – a necessidade permanente de nos alimentarmos.

Qualquer um acha este exemplo acima descabido, mas quais são as verdadeiras diferenças do caso do sangue? É verdade que a batata exige algum trabalho, plantar, mas o sangue também, exige boa alimentação e ainda por cima exige irmos ao banco de sangue que não é omnipresente. Também no caso do sangue temos um inconveniente em darmos o nosso, a perda de hemoglobina é indiferente para as actividades do dia-a-dia mas certamente um ciclista ou um maratonista recusam-se (estes chegam a treinar em grandes altitudes de modo a que o corpo a produza em maior quantidade). Chegamos à conclusão que o nosso sangue é útil e quando o damos saímos momentaneamente prejudicados.

 

Mas agora no caso contrário, apliquemos o mercado ao líquido vermelho que todos querem. Se o sangue fosse pago, seríamos compensados por dá-lo, é verdade que não podemos ganhar a maratona mas talvez ajude na prestação da casa. Como as batatas, há uma vantagem na facilidade da produção de sangue, quanto mais pessoas se fossem oferecer para dar sangue, mais cairia o preço, pelo menos enquanto não se assinar na EU uma política de sangue comum. A questão da qualidade já hoje é assegurada com vários testes, não há necessidade de pensar nela, a não ser pelo número de amostras que se teria, muito maior, de modo a que os padrões podiam até subir.

Do lado do consumidor, este tem mais sangue e de melhor qualidade, por um preço, claro. Mas ele pode ter dado sangue anteriormente, logo pode pagar com o que poupou. O resultado seria na pior das opções nulo e na melhor, uma vantagem económica.

 

As objecções:

O sangue não deve ser pago porque é desumano/não custa nada/não é eticamente correcto. É uma necessidade, como há a necessidade de penicilina, anti-hipertensores ou proteínas. A economia baseia-se em interacções para colmatar as necessidades de todos, inicialmente as mais básicas e evoluindo para as mais fúteis como iPads ou anéis que brilham na discoteca. A caridade é bonita mas em todos os casos beneficia de um mercado que aumente os recursos, facilitando a primeira. Era mais bonito que cada um ajudasse o próximo apenas porque sim mas por alguma razão não foi assim que evoluímos.

Os pobres vão deixar de ter acesso. Não necessariamente, por duas razões: mercado não exclui caridade (até ajuda por baixar os preços e aumentar a quantidade de bens disponíveis) e, tal como o regime gosta de subsidiar medicamentos, também pode subsidiar o sangue, taxando mais o contribuinte e dizendo que é “para o bem maior”, “para o desenvolvimento”, “pela saúde pública”, ou outro slogan que as agências de marketing possam pensar.

 

Não me tomo por um homem burro nem como o génio que vai revolucionar a história. Mas uma análise baseada no mercado livre do problema da escassez do sangue leva a estas conclusões e não é preciso muito para lá chegar nem para ver as vantagens.

Num país que não impusesse restrições éticas quanto à propriedade do corpo esta questão não se punha, as pessoas vendiam e o estado não tinha nada a ver com o assunto. Para os grandes órgãos como corações ou fígados não é linear que a escassez gritante fosse resolvida mas pelo menos no caso do sangue, tão fácil de transformar em bem de consumo e com matéria-prima tão abundante, a solução passar pelo mercado é tão óbvia que só os fundamentalistas religiosos e os socialistas é que são capazes de a ignorar.

publicado por João Rodrigo às 20:38

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