O REPLICADOR

Janeiro 31 2010

 

 

E na Universidade também.

publicado por Filipe Faria às 04:22

Janeiro 29 2010

Um artigo do jornal “Público” revela o facto de as mulheres terem em média mais sucesso académico do que os homens e de que se está a formar uma nova classe baixa constituída por rapazes que fracassaram na escola. Nada de novo. O que também não é novo são as explicações dadas por sociólogos e pedagogos que se baseiam, em larga medida, na famigerada teoria da tábua rasa que considera que temos todas as mesmas características e que as diferenças apresentadas são apenas resultados da educação e da cultura. Este excerto do artigo é elucidativo:

 

“Especialista em assuntos de Educação, o sociólogo francês Christian Baudelot defende que, antes de mais, aquilo que é pedido pela escola é a interiorização das suas regras, mas que estereótipos sociais ainda dominantes valorizam nos rapazes o desafio, a violência e o uso da força - um verdadeiro "arsenal antiescolar". As raparigas, pelo contrário, são socializadas na família em moldes que facilitam a adaptação às exigências escolares: mais responsabilidade, mais autonomia, mais trabalho. "Trata-se de um conjunto de competências que as torna menos permeáveis à indisciplina", observa Teresa Seabra. No ano passado, em Espanha, 80 por cento dos alunos com problemas disciplinares eram do sexo masculino.”

 

Desta forma, como acreditam que tudo se resolve pela educação, desenvolvem constantemente engenharias sociais para igualizarem o inigualável cometendo cada vez mais erros ao não permitirem que cada elemento seja livre para escolher o seu caminho segundo as suas características inatas e os seus instintos.

 

É muito claro que há diferenças genéticas entre rapazes e raparigas (eu pelo menos olho sempre para esses sinais distintivos nas fêmeas): os traços físicos, a força, a impulsividade, a drive sexual,  a agressividade que está ligada aos níveis de testosterona (superiores nos homens), etc etc. Contudo, os nossos amigos das pedagogias acham que tudo se deve à educação e à pressão social, como se os meninos e meninas não tivessem instintos próprios para reagirem ao contexto que as rodeia. Para estes educadores as pessoas são meros balões que voam para o lado que sopra o vento, ou seja, retiram da equação qualquer noção de livre arbítrio ou de responsabilidade pessoal.

 

 

 

 

Assim sendo, acreditando nestes pedagogos adeptos da teoria da tábua rasa, todas as tendências que separam os 2 sexos só se podem explicar por acordos sociais que os homens fizeram entre si e por acordos sociais que as mulheres fizeram igualmente para criar a tal “pressão social” e os tais “estereótipos”. Vamos esquecer os contratos sociais de Rousseau ou Hobbes ou Locke, este é “o verdadeiro contrato social” para estes pedagogos. Aqui ficam algumas das premissas acordadas:

 

  • Os homens acordaram entre si morrer em média mais cedo enquanto que as mulheres preferiram acordar morrer mais tarde. Os homens até acordaram terem taxas de suicídio bastante superiores às das mulheres (esse radicais contratuais).

 

  • Os homens acordaram terem (em média) mais força, maior drive sexual, mais comportamentos de risco e serem menos organizados do que as mulheres, elas acordaram o contrário porque queriam parecer melhor em vestidos.

 

  • Os homens concordaram em ser maus na escola porque os pais lhes diziam para serem viris e não para serem bons alunos (alguém acredita nisto?). Já as mulheres concordaram em ser boas alunas porque os pais lhes disseram para elas serem bem comportadas e boas estudantes (e não é que elas obedeceram).

 

  • Uma das premissas acordadas por unanimidade entre os homens é o facto de geralmente fazerem pouco trabalho doméstico (visitem a casa de um solteiro médio e provavelmente vão encontrar no frigorífico sandes azuis de bolor feitas em 1996). Por outro lado, as mulheres acordaram que o trabalho doméstico precisa de ser feito por uma questão de necessidade e mesmo quando não o apreciam particularmente tendem a fazê-lo com competência.

 

  • Eles acordaram em ter uma capacidade de movimentação espacial superior e elas acordaram ter uma inferior porque acharam que bastava terem melhores capacidades comunicativas (e seios) para dominarem os movimentos dos machos. 

 

No fundo estes pedagogos são contratualistas que pregam uma reformulação deste “verdadeiro contrato social” de forma a que homens e mulheres acordem as mesmas coisas no sentido de obterem uma massa igualitária. É isso que estão a tentar. Porém, como o ser humano não é uma tábua rasa preenchido pelas suas políticas educativas e como ainda estamos longe de conhecer com exactidão os fenótipos das milhões de combinações de genes humanos, seria bom que admitissem a sua ausência de conhecimento e dessem liberdade de escolha para cada um escolher o seu caminho escolar e profissional.

 

Em média, homens e mulheres têm tendências comportamentais diferentes que se manifestam desde bebés (quando a influência da educação é ínfima), mas todos terão capacidades que podem ser optimizadas por eles mesmos numa sociedade pluralista e descentralizada.

 

PS: Outros textos sobre o assunto : Educação em Portugal: A Crença na Tábua Rasa, Steven Pinker: Acerca da Tábua Rasa

 


Janeiro 28 2010

 

 

"Come pick me up
Take me out
Fuck me up
Steal my records
Screw all my friends
They're all full of shit
With a smile on your face
And then do it again"

publicado por Filipe Faria às 16:44
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Janeiro 27 2010

Segundo reza a história, há duas coisas na vida a que não se consegue escapar: à morte e aos impostos. Apesar de não nos salvarem da morte, as fraudes fiscais rapidamente destruiriam este provérbio. Há quem seja bem sucedido na fuga aos impostos e o sistema fiscal complexo que temos actualmente é um convite à descoberta dos “buracos” fiscais que permitem essa mesma fuga (os inúmeros escalões, benefícios e deduções que existem são sistemicamente incompreensíveis). Claro que há quem justifique a fuga a impostos através da moral e que o faz como protesto contra um Estado injusto. Certo, mas não procuro neste texto dissecar a epistemologia do imposto.

 

Na prática, para além de ser vulnerável à fraude fiscal, o actual sistema de múltiplos impostos (tais como o IVA, IRS, IRC, Imposto sobre veículos, sobre o combustível, etc) tem os seguintes efeitos negativos:

 

-    desincentiva ao trabalho através dos inúmeros escalões de tributação sobre o rendimento (quem trabalha mais para ser aumentado acaba por pagar mais impostos e fica sensivelmente na mesma)

-    gera uma gigantesca (e dispendiosa) máquina burocrática para permitir o seu funcionamento complexo e torna o processo menos transparente

-    impede que os cidadãos possam investir as poupanças em projectos pessoais que criem valor acrescentado para o país

-    desincentiva o investimento estrangeiro que foge da complicação burocrática portuguesa como um socialista foge do mérito

 

Isabel Correia, investigadora e docente da Universidade Católica, propõe um interessante sistema fiscal de imposto único que simplificaria o processo. Este consiste em acabar com todos os impostos existentes e manter apenas o IVA. Desta forma, mantendo apenas o imposto sobre o consumo, este teria de ser aumentado para permitir ao Estado atingir o mesmo nível de receitas a que (infelizmente) está habituado. Consequentemente, permitiria que os cidadãos ficassem com a totalidade dos seus rendimentos. Este sistema teria as seguintes vantagens:

 

-    porque os indivíduos teriam mais rendimento disponível, promover-se-ia o empreendedorismo e o investimento pela via da poupança 

-    a simplicidade do sistema fiscal permitiria uma maior transparência e seria mais difícil fugir ao fisco, sabendo-se que o IVA é considerado como sendo o imposto menos vulnerável à fuga fiscal

-    o aparelho fiscal de Estado e a sua consequente despesa iriam diminuir consideravelmente permitindo ter um Estado mais pequeno, mais eficiente e menos burocrático

-    o investimento estrangeiro sentir-se-ia atraído por um sistema fiscal simples e estável

-    as empresas exportadoras instalar-se-iam no país porque poderiam exportar sem pagar impostos

-    maior liberdade individual no uso que cada um dá aos frutos do seu trabalho

 

As críticas mais comuns a este sistema de imposto único são as que alegam que este não permite a redistribuição de riqueza e que o turismo seria completamente destruído pela subida exorbitante dos preços devido ao IVA. A primeira crítica é infundada; mesmo que se considere que o sistema fiscal tem a função de redistribuir riqueza (assumpção que nem sequer é democrática), este sistema permite perfeitamente a redistribuição de riqueza através da introdução de deduções ou de subsídios. A segunda crítica faz todo o sentido. Porém, é preciso ter em conta que a introdução de um sistema destes teria de ser executado em concertação internacional, mas, hipoteticamente, mesmo sendo executado apenas ao nível nacional, seria de equacionar se o investimento estrangeiro não compensaria largamente a perdas no sector turístico. Ademais, apesar da sua reconhecida importância, não considero que o nosso modelo de desenvolvimento deva ter o turismo como âncora, pois é certamente preferível ter como modelo uma Suíça com pouco turismo do que uma República Dominicana pejada de turistas.

 

Alguns países europeus de leste já adoptaram políticas fiscais baseadas em 2 impostos: um sobre os rendimentos e outro sobre o consumo, ambos com taxas únicas (flat rate). A tendência será para tentar unificar os dois impostos. Ao nível dos resultados conseguidos, vários destes países, em poucos anos de economia de mercado, conseguiram já atingir um maior PIB per capita que Portugal e, em média, as suas economias crescem mais do que a economia nacional.

 

Qual é então o maior obstáculo à introdução este sistema? O mesmo de sempre: os políticos. Este sistema fiscal de imposto único implicaria menos poder e menos protagonismo por parte dos governantes enquanto que aumentaria a autonomia dos indivíduos e da economia. Resta saber onde estão os políticos que colocam a autonomia dos indivíduos à frente do poder político.

 

publicado por Filipe Faria às 04:54

Janeiro 25 2010
tim9798 (11 months ago) ShowHide

I don't understand why you Americans are so afraid of universal health care, as if this idea is on the edge of reason, its not new, every other 1st world country has it, becouse we believe its a right, not a corporation. And how does socialism = fall of freedom? In case you didn't notice, Sweden is socialist and very free, and to say that universal health care leads to becoming Sweden, well, that's ludicrous.
1) Sweden has a tax rate of over 50%
2) Sweden has a single payer no choice healthcare system
3) Name me a single Swedish Drug of Medical Instrument maker that isn't dependent upon exports to survive
4) Sweden is dependent upon the US for all medical advanvements, not everyone can be a free rider. Once we stop developing new drugs, Sweds will die.
5) In Sweden the young pay for the old, how perverse it that? Children supporting parents?
6) Demographics will topple that system.
drmoogala (4 weeks ago) ShowHide

Well ,first of all America is a unique country,it is not Sweden. What is considered freedom in Sweden is to stay drunk. In America we have a tradition of self-determination. To all you leftist fags what that means is freedom to fail as well as to succeed beyond most people's capacity to dream and everything inbetween. buttcrack and company are contrary to American ways of Life Liberty and the Pursuit of Happiness,not the socialist guarantee of mediocrity for all.
 
Tirado desta caixa de comentários. 
 
PS: para algo completamente diferente:  Uma análise sobre a evolução da Suécia por um sueco (liberal) do Mises Institute.
publicado por Filipe Faria às 05:55

Janeiro 23 2010

Há algum tempo estava na universidade a conversar amenamente com um colega e a comentar a abundância de estudantes do sexo feminino nessa instituição. Ele respondeu-me que esse facto se devia a estarmos numa universidade de ciências sociais que atrai essencialmente mulheres a uma média que supera os 80% em alguns cursos. Hesitei, perguntei-me o que estava ali a fazer, questionei por uns segundos os meus índices de testosterona, e respondi, não muito seguro, que ainda bem que assim é pois desta forma temos mais escolha e um melhor ambiente (pelo menos visual). Ficamos calados por instantes pois ambos sabíamos que elas estão lá geralmente para trabalhar em prol de boas notas e que mesmo que fossemos o Brad Pitt e o Jude Law (apesar de estarmos muito próximos) dificilmente teríamos alguma sorte, ou azar, mediante a perspectiva. Depois acrescentei que, actualmente, já mais de 60% dos alunos universitários são do sexo feminino e que mesmo nos cursos considerados “masculinos” como engenharia ou gestão as mulheres ganham visivelmente terreno. E mais, segundo o Instituto Nacional de Estatística, em Portugal, já no ano de 2004 as mulheres tiravam 2 vezes mais licenciaturas do que os homens. Ele pareceu-me assustado, mas como queria manter a conversa num tom satírico, disse que qualquer dia os socialistas vão querer quotas para os homens poderem entrar nas universidades visto que elas mostram ser mais metódicas e mais disciplinadas que eles, e, em média, isso revela-se nos resultados finais. Continuou dizendo que como os socialistas prezam mais a igualdade de resultados do que o mérito e a igualdade processual, estava à espera que mais ano menos ano surgissem esquerdistas a defender a presença dos homens nas universidades em detrimento das mulheres. Ambos rimos, sabendo-se que os socialistas são sempre uma boa fonte de humor, mas penso que nenhum de nós acreditava realmente nisso. Que ingénuos que fomos.

 

Na realidade, enquanto nós estávamos a ter aquela conversa cuja conclusão julgámos absurda, já os suecos tinham aprovado quotas para os homens no acesso ao ensino superior para combater a supremacia feminina nas universidades locais. Não nos devíamos surpreender, afinal de contas, como se sabe, os escandinavos são o modelo do mundo progressista social democrata. Para além de parecerem mais obcecados com a igualdade redistributiva do que com a liberdade individual, os escandinavos gostam de arriscar em prol dessa igualdade. Arriscaram no prémio Nobel da paz dado a Obama apenas pela sua aura messiânica e arriscaram igualmente na instauração de quotas para garantirem a igualdade de género nas faculdades ao aperceberem-se que as mulheres estão em muito maior percentagem nas universidades do que os homens.

No entanto, como era de calcular, a experiência não correu bem e gerou efeitos discriminatórios claramente injustos:

 

"The regulatory framework has caused inequality, writes Tobias Krantz. Last year it was almost exclusively women, 95 per cent, who got excluded because of their gender."

 

Depois de as mulheres que tinham mérito para entrarem nas universidades terem visto a sua entrada barrada devido ao sistema de quotas para homens, os seus protestos surtiram efeito e o ministro para o ensino superior sueco anunciou que vai terminar com o sistema de quotas considerando que estas geraram mais desigualdade do que igualdade. O mais intrigante desta história é saber como é que não se percebeu de início que este seria o inevitável desfecho, de tão óbvio que era. Naturalmente, a visão deve ter sido toldada pela indomável fúria progressista que visa a igualdade a qualquer custo, mesmo que para isso se passe por cima dos direitos naturais dos indivíduos, no fundo, um clássico da história humana.

 

As quotas, sejam elas para mulheres, homens, negros, brancos ou amarelos, são sempre uma discriminação positiva que vão em última instância prejudicar não só os elementos com mais mérito que vêem o acesso vedado por pessoas com menos mérito, mas também os próprios elementos que são positivamente discriminados, pois estes passam a ser vistos como elementos sem valor que subiram injustamente na sua posição social. Ademais, nenhum sistema pode ser optimizado se o critério principal não for o mérito e o liberdade de escolha.

 

A conversa com o meu colega findou no momento em ele foi socializar com umas colegas do sexo oposto. Mais tarde voltou algo indignado porque elas não pareciam especialmente receptivas. Como consequência, disse-me que se calhar umas quotas de mercado feminino só para ele não seria nada mal pensado, visto não gostar da concorrência masculina externa. Só os socialistas lhe poderiam resolver o problema. Quando o vi a clamar pelo senhor Sócrates lembrei-me do que significam realmente as quotas: privilégios legais sobre outros. 

 

 

 

publicado por Filipe Faria às 03:54

Janeiro 21 2010

 

 O populismo

 

O que é o populismo? Apesar da dificuldade de caracterização do conceito, o populismo é visto como uma patologia da democracia por boa parte da imprensa e comentadores diversos. Em linhas gerais, este pode ser definido como a promessa da devolução de poder ao povo por oposição aos interesses das elites governativas do status quo. Contudo, esta patologia supracitada não é uma patologia da democracia em si mesma mas sim da democracia representativa definida pelas teorias realistas/elitistas da democracia (Schumpeter, Ostrogorsky, Michels, Mosca) que consideram que, numa democracia representativa, o povo deve restringir-se à escolha do governante e pouco mais; consequentemente, quando surge um agente político a pedir mais poder popular, estes proponentes consideram que há um overload no sistema. Da mesma forma, o que este tão criticado fenómeno do populismo faz é explorar as falhas da democracia representativa reivindicando o empowerment popular, rejeitando clivagens sociais ou políticas (esquerda/direita) e definindo o povo através de uma identidade unitária. 

 

O fortalecimento do pilar constitucional nas democracias

 

Depois da má experiência de democracia popular da república de Weimar que originou a segunda guerra mundial, as democracias ocidentais viraram-se para o fortalecimento do pilar constitucional em detrimento do pilar popular,  com especial incidência para a separação de poderes (checks and balances), para as autonomias dos bancos centrais, para a institucionalização de sistemas de direitos humanos e para os tribunais constitucionais. Com esta autonomização institucional das democracias contemporâneas o elemento da autodeterminação popular deixou de ser o foco principal da democracia para ser apenas mais um elemento da mesma. Será esta impotência, esta ausência de poder popular, que os agentes populistas irão capitalizar sempre que existir descontentamento popular. Paradoxalmente, numa altura onde existem mais democracias no mundo do que alguma vez existiram, o descontentamento com a classe política e o respectivo desinteresse crescente revelam uma desilusão em relação às capacidades dos sistemas democráticos para cumprirem com a sua função de representação popular.

 

A erosão dos partidos e o surgimento do pilar populista

 

O cientista político Peter Mair considera que à medida que o pilar constitucional se vai reforçando o pilar popular (de partidos) vai sendo substituído pelo pilar populista (sem partidos).  O pilar popular baseia-se na representação popular através dos partidos, onde as várias vontades populares, organizadas em partidos com ideologias definidas, competem pela representação governamental. O pilar populista representa a erosão dos partidos, o respectivo esvaziamento ideológico, a sua transformação em agências burocráticas de acesso a cargos governamentais e a sua direcção personalista de cima para baixo onde os líderes dos partidos usam a retórica populista para angariar votos, personificar o partido através de uma voz única e assim suportarem a estrutura partidária. O exemplo mais evidente deste processo de passagem da democracia popular para a democracia populista  é o New Labour de Tony Blair.

 

O  modelo populista do New Labour

 

Quando chegou ao poder em 1997, o New Labour de Tony Blair lançou a devolution, que assumiu o carácter de revolução constitucional. Esta baseava-se numa massiva descentralização e autonomia regional que criaram o parlamento escocês e as assembleias do País de Gales e da Irlanda do Norte. Incorporou ainda a convenção europeia dos direitos humanos na lei britânica, criaram-se sistemas proporcionais nos parlamentos regionais, introduziu a eleição directa do mayor de Londres e aboliu votos hereditários na Câmara dos Lordes; como consequência, o parlamento de Westminster sofreu uma importante restrição na sua soberania. A 3ª via de Anthony Giddens (que se baseia na inescapável compatibilização entre capitalismo e socialismo) foi usada por Tony Blair para tentar acabar com a noção de esquerda e direita procurando unir o povo e a nação num único objectivo para o qual não há alternativa. O objectivo seria o de centrar o diálogo entre o “eu” personalista do político carismático e o povo, sem clivagens e sem intermediários.

 

Populismo como modelo para a União Europeia

 

À medida que vai entregando (uma aparente) autonomia às regiões, o acesso ao poder central vai ficando cada vez mais distante do cidadão devido à erosão dos partidos como entidades representativas. Este modelo populista lançado por Tony Blair será em larga medida o modelo colocado em curso pela União Europeia no seu processo de integração. Este irá basear-se na democracia populista e no constitucionalismo tornando-se evidente que os partidos terão muita dificuldade em funcionar ao nível da integração europeia. Também aqui veremos uma Europa das regiões com autonomia mas onde o processo de decisão central é afastado dos cidadãos, facto patente no funcionalismo utilizado para a construção europeia e na aversão à consulta popular quando esta contraria os interesses das elites europeias.

 

Democracias em piloto automático

 

O crescente foco populista em personalidades carismática denotam a tentativa de disfarçar o que vai sendo cada vez mais evidente: as democracias ocidentais estão em regime de piloto automático constitucional e elitista. O populismo deixou de ser essencialmente uma arma de protesto contra o sistema (que até tinha a vantagem de servir para romper carteis partidários) para ser a própria arma ao serviço do elitismo governamental através de um constitucionalismo autónomo. Ademais, a União Europeia usa uma retórica que  não raras vezes é identificada com o populismo da extrema direita, negando clivagens ideológicas e enfatizando, em formato de subtexto, o povo (europeu) e a nação unitária (os almejados Estados Unidos da Europa), sendo o passo seguinte a escolha de políticos sedutores capazes de mobilizar as massas.

 

Ausência de escolha

 

 

Patentemente, os partidos contemporâneos perderam a sua capacidade de representação popular. A integração europeia retirarou-lhes margem de manobra para representarem as vontades dos cidadãos. Ideologicamente, as ofertas partidárias são em quase tudo semelhantes, precisando de se diferenciar e de capitalizar os votos através do personalismo dos candidatos por já não se conseguirem destacar pelos programas que propõem, ou seja, os indivíduos deixam de ter escolha programática efectiva.

 

Em suma,  este fenómeno colocaria em causa a qualidade da democracia se esta fosse um conceito estanque, como não é, qualifica-se apenas como mais uma variante da mesma; porém, permitam-me dizer que sem escolha não há real democracia; resta saber que escolha é possível ter em democracia. 

 


Janeiro 17 2010

 

 

publicado por Filipe Faria às 02:08
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Janeiro 16 2010

Com toda a razão, a Maria João Marques escreveu que já não há paciência para os típicos comentadores “imparciais” de esquerda (mesmo quando se proclamam de direita) que vão à televisão comentar a política nacional. Foi até mais longe qualificando muitos deles de “esquerda mascarada de direita”.

 

Não podia estar mais de acordo; porém, este fenómeno é apenas um sintoma da estruturação política portuguesa, ou seja, um reflexo e não uma causa. Num país onde o (suposto) principal partido direita é SOCIAL DEMOCRATA, alguém pode ficar surpreendido que os comentadores que se dizem de direita não acompanhem essa linha? Nunca é demais repetir verdades auto-evidentes quando elas são ignoradas pela comunicação social: a SOCIAL DEMOCRACIA é uma corrente de centro esquerda em qualquer país do mundo. Podemos tapar os olhos regularmente e fingir que o elefante não está na sala, mas todos os dias chocamos contra ele.

 

Bem sei que logo surge alguém (normalmente de esquerda em tentativa de auto-legitimação) que alega que isso é só o nome do partido e que o DNA do mesmo é de direita. De facto, o PSD tem alguns traços de direita nos valores sociais (apesar de cada vez menos), mas não diverge em nada do Partido Socialista na forma de olhar para o Estado e para o país. O PSD sempre foi liderado por keynesianos e sociais democratas, que se distinguem do PS por colocarem ênfase em pontos diferentes da propaganda política devido à necessidade de terem um produto distintivo no mercado do voto, mas que são substancialmente semelhantes em quase tudo. Basta para isto dizer que o peso do Estado cresce (pelo menos) tanto com o PSD como com o PS. 

 

Num país onde a direita é representada pela esquerda, não nos devemos surpreender que os comentadores políticos que estão na televisão sejam uma “esquerda mascarada de direita”, devemos sim ficar surpreendidos quando surgem comentadores que são realmente de direita (que vão começando a surgir), mas mais surpreendidos devemos ficar quando surgem políticos portugueses realmente de direita no arco de governação (que não surgem de todo).

 

publicado por Filipe Faria às 17:43

Janeiro 14 2010

"Every intellectual has a very special responsibility. He has the privilege and the opportunity of studying. In return, he owes it to his fellow men (or “to society”) to represent the results of his study as simply, clearly and modestly as he can. The worst thing that intellectuals can do – the cardinal sin – is to try to set themselves up as great prophets vis-à-vis their fellow men and to impress them with puzzling philosophies. Anyone who cannot speak simply and clearly should say nothing and continue to work until he can do so."


Popper, Karl: Against Big Words, in: Karl Popper: In a search of a better world. Lectures and essays from thirty years, London 1994, p.83.

 

publicado por Filipe Faria às 22:30
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Janeiro 12 2010

They both met on that critical night, but they were not alone. Each one of them had a group of allies and diplomats who they called friends; moreover, it was becoming clear that this night would set the beginning of something decisive for the future of both parties. In the same way, like at every crucial moment, weapons were properly prepared before they met. Something similar to a nuclear arsenal had been built for a long time now and it is safe to say that the two of them had some of the most destructive weapons that exist in our contemporary world; still, they were prepared to act as if they were just having a casual meeting, one in which mere details would be discussed. It did not take long for the negotiations to begin. First, they exchanged everlasting smiles. Afterwards, they used their best arguments in order to be convincing. Did they come to an agreement? No, but it is not certain that this possibility actually existed. Obviously, their goal was not to reach an agreement, it was to show each other that they were powerful enough to counter attack in any circumstance. They knew that peace would not come in any sustainable treaty. As a consequence, the only way to have peace — ­and to deal with uncertainty — was to promote the idea of psychological passive-aggressiveness. In other words, without actually expressing it, they said to each other: do not attack me and I will not attack you, because we both know the price to pay.

 

The meeting took place in a neutral area in which neither of them could feel at home. Apart from what they wanted to convey, many more topics were mentioned: politics, culture, art, and even some (apparently) pointless facts about show business. It is safe to say that all the important messages had to be read between the lines. Some call it hypocrisy; yet, when playing the game, most people call it diplomacy. In that room where they stood, nothing was clear, anything could happen, but she was certain that he was someone who could make a difference in her life, while he saw her as someone exciting who made him rethink the concept of love. What love? What does it mean? Would they act on it? Ready or not, they knew what it meant. It meant war.

 

publicado por Filipe Faria às 19:20

Janeiro 11 2010

 

"The left, we might think, has had a bad time of it intellectually over the last 15 years: socialism has collapsed, Marxism has little or no credibility and supposedly left of centre governments across the world have accepted privatisation and the private sector.

 

But in the academy things are very different. It is very rare indeed to come across a classical liberal or a conservative in a university humanities or social science department (I have to look in a mirror to see one in my public policy department)."

 

A Guide to Modern Lefties - Por Peter King - Via Insurgente

 

publicado por Filipe Faria às 04:30

Janeiro 09 2010

Ronald Reagan resumiu na perfeição o pensamento dos governos contemporâneos em relação à economia quando identificou as 3 fases comportamentais dos mesmos: se algo se move taxa-o, se se continua a mover regula-o, e quando pára de se mover subsidia-o.

 

O governo francês não é particularmente  criativo. Perante o problema do declínio da industria musical francesa o que é que faz? Subsidia-o. O que significa, em larga medida, que este sector chegou à terceira fase, ou seja, parou de se mover.

 

Segundo esta notícia, o governo francês tenciona taxar a publicidade na internet (sendo o google um dos principais visados) para subsidiar a industria musical, visto que esta está a ser “destruída” pela internet. Desta forma, a política Robin dos Bosques visa roubar os maus para dar aos bons. É justo. O que já não é tão justo é os ouvintes terem de ouvir o resultado final da música subsidiada, que é, em última instância, a principal razão do declínio. Quando a música não tem qualidade suficiente para crescer junto do público, quando não se expande e não se internacionaliza, só pode chegar a este ponto. Depois de anos de quotas na rádio para a música francesa e de proteccionismo cultural e económico nessa área, finalmente a industria pára, ou se não pára, pelo menos vai rastejando. Porém, em vez de alterar a estratégia e deixar os agentes musicais procurarem soluções para tornar a sua música mais dinâmica, o governo Francês volta às soluções dirigistas de subsidiação.

 

Quando se perguntarem porque é que o mundo consome essencialmente música anglo saxónica, não é preciso procurar muito. A resposta é simplesmente porque esta é produto do empreendedorismo musical e não de uma cultura de subsidiação. 

 

 

 

publicado por Filipe Faria às 19:38

Janeiro 09 2010

1- Sobre o estado de natureza hobbesiano

 

Segundo Friedrich Hayek, o estado de natureza de Thomas Hobbes é um mito; refere-se naturalmente ao estado cruel onde o Homem vive  num estado permanente de todos contra todos. O modelo individualista, ultracompetitivo e agressivo que Hobbes propôs para explicar as origens das sociedades nunca podia ter existido segundo o autor austríaco. Da mesma forma, Darwin defende que o Homem sempre foi social desde que nasceu, com laços competitivos mas também de entreajuda entre os membros geneticamente mais próximos, ou seja, da mesma tribo. Igualmente, o próprio Hayek caracterizou o homem selvagem de uma forma que poderá surpreender os que o vêem como um extremo defensor da cultura individualista:

 

“The savage is not solitary, and his instinct is collectivist”

F. Hayek

 

2- Evolução social

 

Ambos consideram que a selecção natural se faz ao nível do indivíduo e não do grupo, mas isto é essencialmente válido no campo da evolução biológica. No campo da evolução social (ou cultural) o processo é, em larga medida, Lamarckiano: as inovações que foram adquiridas durante o espaço de uma vida são transmitidas à comunidade de forma a produzirem uma sobrevivência  e reprodução mais eficazes. Ambos os autores consideram que a capacidade para imitar é provavelmente a característica mais importante para o desenvolvimento do conhecimento humano. Darwin chegou mesmo a aceitar a premissa de Alfred Wallace quando este diz que muito do trabalho inteligente do homem é feito por imitação e não através da Razão. Mais especificamente, a título de exemplo, quando um homem inventa uma arma eficaz para si mesmo, com o intuito de atacar ou defender, todos os outros elementos vão imitá-lo, não porque vão usar a Razão para racionalizar as consequências, mas sim por razões emulativas de equilíbrio de poder e sobrevivência.

 

3- Transmissão de cultura

 

A transmissão de cultura entre grupos foi descrita por Darwin da seguinte forma:

 

“We can see, that in the rudest state of society, the individuals who were the most sagacious, who invented and used the best weapons or traps, and who were best able to defend themselves, would rear the greatest number of offspring. The tribes, which included the largest number of men thus endowed, would increase in number and supplant other tribes. Numbers depend primarily on the means of subsistence, and this depends partly on the physical nature of the country, but in a much higher degree on the arts which are there practised. As a tribe increases and is victorious, it is often still further increased by the absorption of other tribes”

C. Darwin

 

 

Desta forma, ao contrário dos argumentos dos defensores da cultura imutável, a cultura e a evolução social dão-se de forma transcultural através da imitação das inovações que se impõem como mais eficazes para resolver problemas. Em paralelo, um determinado grupo que perceba que outro grupo está a dar-se bem com determinadas inovações políticas irá sentir-se tentado a adoptar essas mesmas políticas. A isto podemos chamar globalização cultural, que apenas oferece resistências quando os Estados centrais, ou outras organizações centralizadas, rejeitam essas mesmas inovações que provêm de outras localidades. O indivíduo facilmente adopta essas mesmas inovações que funcionam com outros indivíduos, mas nem sempre os Estados têm interesse em fazê-lo por razões que se prendem com a manutenção de poder.

 

4- Solidariedade social e Estado

 

Ao rejeitar o contrato social hobbesiano por considerar que o estado prévio ao contrato não define a natureza humana, Hayek relembra que a ideia de Darwin não é a simples vitória dos mais aptos através da dura competição, é sim uma mistura de cooperação e competição que permitiu o desenvolvimento humano até aos dias de hoje, sem que fosse o contrato social a definir as premissas fundamentais do comportamento humano. Não será por existir mais intervenção dirigista do Estado que vamos cooperar mais nem por haver menos intervenção de Estado que vamos competir mais, podemos é competir pior e cooperar pior. Naturalmente, ao perguntarmos qual a solução que mais beneficia o todo, a resposta é clara, não só em Hayek mas também em Darwin: a política da liberdade individual e da não intervenção estatal, pois a entreajuda e a solidariedade social não começaram com o Estado providência, nem sequer com o Estado, começaram sim com os primeiros humanos.

 


Janeiro 06 2010

A personagem principal de Californication tem sexo com uma mulher deslumbrante em cada episódio, mas isso não chegou para que se tornasse no meu herói. Porém, já como professor universitário, quando passou uma aula inteira de literatura a perorar sobre o quão execrável é a banda Coldplay, ganhou imediatamente esse estatuto.

 

 

publicado por Filipe Faria às 20:08

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