O REPLICADOR

Maio 13 2011

 

Gostava muito que lessem esta notícia de grande interesse:

http://www.ionline.pt/conteudo/123085-existem-novos-poderes-que-utilizam-comunicacao-social-os-seus-proprios-fins

 

A notícia mostra dois grandes peixes, cada um com a sua narrativa, ambas de um interesse amplo para a... paródia.

 

Começamos com Francisco Balsemão a dizer que “existem novos poderes que utilizam a comunicação social para os seus próprios fins”. Bom, ainda bem que o i nos avisa disto porque ninguém sabia. E ao mesmo tempo não estou a perceber muito bem onde quer ele chegar. Refere-se aos políticos? Aos privados? Às empresas de marketing? Às meninas a tentar pagar as propinas que expandem o negócio através dos anúncios?

Quanto aos políticos, desde as primeiras repúblicas que eles usam a comunicação para convencer (ou enganar) as pessoas. Portanto não são estes de certeza, é tudo menos novidade.

Os privados também metem a sua colher. Afinal de contas eles também têm um produto a vender e uma ajudinha de umas notícias que passem por verdade não prejudicam ninguém... a não ser os competidores. E, tal como os políticos, não estou a desvendar uma novidade. Adiante, tanto as empresas de marketing como as meninas estão nos jornais há muito tempo.

Se calhar refere-se às agências de rating e fundos de investimento que aproveitam os media para difundir mini-pânicos e lucrar com movimentos síncronos de vendas e compras. É, é capaz de ser isto. O Francisco Balsemão prefere deixar o mistério no ar (aumentando assim exponencialmente o sex-appeal), ninguém me impede de chegar às minhas conclusões.

 

Centremo-nos agora no que ele se esqueceu de dizer: de quem é a culpa da comunicação social ser manipulada pelos interesses de outras posições de poder? Bom... é da comunicação social, até provado o contrário. São os jornalistas que perseguem as “celebridades” para obter a sua próxima capa e é muita a publicidade pertencente a estado, organismos estatais e empresas a estes ligadas que assim pode manipular (palavra feia, hoje prefere-se “retocar”) as notícias que chegam ao público geral. Pronto, a culpa pode ser um pouco do estado por absorver uma quota de mercado suficientemente grande para lhe conferir influência. Mas não vejo os media a tentar resolver o problema (que implicaria muito provavelmente reduzir dimensões e lucros), vomitam muitas vezes a palavra “deontologia” mas o resultado é o mesmo que o do traficante de droga que tem muita pena de a andar a vender às criancinhas. Queixem-se menos, façam mais.

 

Depois vem a vez do presidente da Lusa nos agraciar com pedacinhos de sabedoria. Afonso Camões começa por colocar dúvidas sobre a privatização da agência. Compreendo, eu também coloquei dúvidas em saír da barriga da minha mãe, afinal de contas é quentinho lá dentro e cá fora há todo o tipo de perigos.

 

“Qual é o grupo privado que está disposto a pagar para que a Lusa esteja presente em Elvas, Bragança ou Timor-Leste?” diz ele. Não sei, juro que não sei. Afinal de contas, Elvas, Bragança e Timor-Leste são locais perfeitamente desertos, sem pessoas, com pessoas destituidas de posses ou sem interesse algum no que se passa nas suas terras. Este é o grande problema do pensamento socialista (ou antes, um deles, já que o socialismo tem suficiente para escrever tomos enciclopédicos), o “é muito caro para ser pago por pobrezinhos”. Ignora completamente factores como a competição e a pressão desta nos preços, adequação do tamanho do serviço e mesmo o desejo de acesso ao serviço. Facilmente podemos imaginar que em Bragança por exemplo (apego-me ao local que melhor conheço mas é extrapolável) não precisaremos de um corpo jornalístico massivo, pode ser pequeno e com poucos meios resolve-se o problema. Também as empresas em Bragança estarão dispostas a entrar no jogo já que a comunicação é uma arma importantíssima no arsenal dos privados e finalmente, se não há gente em Bragança que queira notícias da sua terra, então qual é a utilidade de uma agência notíciosa lá? Nenhuma. Se o resto do mundo quiser notícias de Bragança, que mandem os seus reporteres para lá.

Quando pensamos em todos os serviços da humanidade nunca podemos deixar de ter em conta a meta final, SERVIR. A qualidade de vida de um português médio é uma casa com piscina e um carro de alta cilindrada mas do francês pode ser viajar várias vezes para outros países, todos os anos. Não se contesta o que cada um toma como o seu ideal, os serviços moldam-se em volta dos consumidores e não são iguais de região para região.

 

Finalmente, e esta é a minha favorita, “Afonso Camões adiantou ainda que a sobrevivência das agências noticiosas no geral e na Lusa, em particular, deve passar por conteúdos pagos, combatendo a “pirataria” reinante atualmente.”

 

A sério? Vamos combater a pirataria com conteúdos pagos!

 

Esta ainda é melhor que a das agências de música que quer combater o fantasma omnipresente da pirataria com repressão polícial. Imagino-o a tentar explicar isto numa acção de sensibilização de crianças da creche e elas a rirem-se na cara dele. É que a lógica é simples: as pessoas estão a começar a habituar-se a não pagar por coisas que podem ter de graça. Hoje já sei mais do que aconteceu na queima das fitas de Coimbra pelo facebook (mau exemplo, eu sei) do que alguma vez saberia antes do advento das redes sociais. E os media, como as editoras, têm de entender que o seu papel como distribuidoras de conteúdo diminuiu drasticamente a partir do momento em que este conteúdo deixou de escassear. É uma evolução natural, tal como o momento em que as transportadoras de gelo se depararam com a criação do frigorífico doméstico.

 

Ou então podem seguir o mesmo método que as editoras de música tentaram. “Mais conteúdos pagos!”, ninguém quer pagar portanto nós disponibilizamos mais serviços pagos. Faz o mesmo sentido que meter a bola no buraco do quadrado, só se entende quando somos bebés. E o resultado será o mesmo, as agências noticiosas conseguirão alienar ainda mais depressa os consumidores, passando depois para o método empregue hoje, a penalização da distribuição de notícias que não seja por empresas criadas específicamente para o efeito.

 

Eu por acaso pagava por notícias a sério, acham que se arranja isso? Não, não pode ser por causa das pressões dos “novos poderes”? Hm, está bem, vou então ao facebook e aos blogs, não se pode dizer que sejam menos fiáveis que o telejornal.

publicado por João Rodrigo às 14:41

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